“Potatoes are plants that can grow in hard earth areas to make the soil lose.”
Elgin

Este é o segundo ano que estou a cultivar uma horta. Ainda sei pouco e mesmo aquilo que pensava saber, descubro que não “sabia” realmente.
O meu principal objetivo com a horta é ter um laboratório onde posso estar em relação direta com a natureza, entrar em diálogo e criar em conjunto. Segundo o princípio da co-criação de Machaelle Wright, o espírito humano exerce a sua ação criativa declarando o propósito de um espaço e deve depois permitir que seja a natureza a orquestrar e a comunicar-lhe de que forma essa intenção se pode materializar.
Procuro entrar nesse diálogo, por enquanto apenas de forma intuitiva. Um dos principais desafios é o respeito. Poder abrir-me para sentir a horta e sentir a vida na perspetiva de cada um dos seres que a habitam. Poder abrir-me para os escutar, aprender com eles e ter a inspiração do que preciso de fazer a seguir. E no final adoro sentar-me ali ao anoitecer, na companhia cúmplice das plantinhas, a sentir como as estrelas e a lua irradiam e nutrem a todos naquele espaço.
Inspirada por algumas dicas da permacultura, planeei os cultivos de forma a incluir plantas que me ajudem a melhorar o solo, tanto em termos de nutrientes como de estrutura. Cada planta aporta algo diferente: algumas têm lançam raízes profundas que ajudam a abrir o solo, outras libertam
nutrientes, algumas atraem polinizadores, outras afastam pragas, etc.
Eu sabia isto, mas quando a Elgin escreveu num grupo de partilha sobre hortas: “Potatoes are plants that can grow in hard earth areas to make the soil lose.”, algo dentro de mim vibrou.
Numa perceção subtil o espírito da batata mostrou-se e disse-me: “Nós cumprimos funções.” Esta mensagem vinha carregada de uma alegria vibrante, uma alegria de Ser. Percebi que o nós se referia não apenas à batata, mas a todas as espécies vegetais. Como se algo as ligasse a uma mesma origem, como se proviessem de uma mesma fonte. O nós tinha imbuído uma forte vibração de pertença, a consciência de co-pertencer a um Todo, de ser esse Todo em manifestação particular.
Fiquei intrigada. Qual é essa origem comum? Qual é a raiz de onde todos provêm? Senti um corpo que se estende e cobre toda a Terra, um super-organismo que inclui toda a vida orgânica do planeta dentro de um campo de consciência unificado. Gaia! Foi então que presenciei uma sinfonia extasiante, e antes disso contemplara uma palete de cores subtis de uma beleza indescritível. Percebi que cada ser (espécie) à face da Terra é uma dessas cores ou sons, com a sua tonalidade particular, ou seja, com a sua qualidade ou função.
Da forma como percecionei, Gaia é diferente do planeta em si, habita-o. Este super-organismo da vida orgânica interage com os elementos do planeta e do cosmos. Cumpre uma função. Mas qual? Que inteligência o criou e com que propósito? E qual é a nossa função dentro desse desígnio?
Vi Gaia como um ser, feminino. Senti um fluxo de amor do meu coração para ela, que emergiu como algo natural, sem esforço. Fiquei com a impressão de que a sua consciência nos pode ajudar a compreender a função de cada coisa, mas não consegui explorar mais.
A sensação desse seu corpo, feito com cada espécie da imensa biodiversidade da Terra, é extasiante. E se cada espécie cumpre uma função, então essa espécie é uma célula ou um órgão do corpo de Gaia. Por consequência, fui levada a deduzir que a perda extensiva da biodiversidade corresponde ao colapsar das funções vitais dela.
Mas não me consegui deter em lamento, culpa ou medo. Sentia apenas o vínculo de amor e o desejo de o expandir mais. Talvez essa seja a chave: relembrar-nos do nosso amor por Gaia, por esse todo do qual também somos parte. Uma chave que nos permite abrir a compreensão e obter uma perceção justa de cada coisa, bem como daquilo que somos realmente chamados a fazer perante os
atuais desafios ecológicos.
Eu achava que sabia que as plantas cumprem diferentes funções..., sabia, mas estava a ver isso de forma egoica, ao serviço dos meus interesses, e isso é uma perceção distorcida da realidade com vastas implicações. As plantas cumprem diferentes funções, sim!, mas no super-organismo da vida orgânica da Terra, ou seja, no corpo de Gaia, do qual nós também somos parte. Esta correção de perceção é um exemplo das subtilezas que só o amor consegue revelar.